Década de criação das principais bandas do rock nacional, os anos 1980 foram dominados pelo gênero musical importado dos Estados Unidos, que dia após dia conquistava as rádios e, consequentemente, o público brasileiro. Paralelamente, o Brasil presenciava, em outro extremo da música, a criação e ascensão de um dos maiores nomes do samba — o grupo Raça Negra, que completa 40 anos de carreira em 2023. Comandada pelo cantor Luiz Carlos, a banda chegou para dividir a soberania musical do país com o movimento roqueiro e mudar a trajetória do estilo tipicamente brasileiro, sendo pioneira no segmento do samba romântico e abrindo portas para a era paulista do gênero.
O conjunto musical responsável por sucessos atemporais, como Cheia de manias, Cigana e Doce paixão, inovou a sonoridade do ritmo, incluindo elementos de sopro, metais e cordas no repertório, dando fim a época dos sambas só com pandeiros, cavaquinhos e violão. Levando o samba a lugares nunca antes alcançados, como as rádios FM, o Raça Negra faz parte da trajetória de muitos dos grupos que fazem sucesso nos dias de hoje.
Após quatro décadas, o grupo continua a provar sua relevância, sendo lembrado como uma das bandas mais queridas do Brasil. Ao longo da turnê de comemoração de 40 anos, os artistas voltaram para o ritmo do início da carreira e têm feito cerca de cinco shows por semana. “Nós conquistamos o público com a nossa maneira de cantar. Misturamos o romantismo do Roberto Carlos com o balanço do Tim Maia”, avalia o vocalista Luiz Carlos, que também aponta Jorge Ben Jor e Bebeto como influências centrais para a sonoridade do Raça Negra. “As pessoas nunca tinham visto um violino no samba, por exemplo. Foram coisas como essas que chamaram muito a atenção do público”, opina.
Para o cantor, o segredo por trás da longevidade do conjunto é a relação com os fãs. “Nós não achamos que somos os grandes artistas. Na verdade, o público é o verdadeiro artista. Foram eles que nos deram a oportunidade de fazer nosso trabalho por tanto tempo. Se fosse da vontade deles, não existia mais Raça Negra”, garante Luiz Carlos, que aprendeu a tocar violão aos 15 anos de idade, com o cunhado, e nunca mais parou. “O grande segredo é entender a responsabilidade do público no nosso sucesso”, complementa.
São diversas as conquistas do grupo paulista: na década de 1990, o Raça Negra foi o artista nacional a receber o maior cachê do país, enquanto a faixa É tarde demais entrou no livro dos recordes ao se tornar a música mais tocada em um único dia no mundo. Hoje, são 2 milhões de ouvintes mensais nas plataformas digitais, 12 milhões de seguidores nas redes sociais e 1,5 bilhão de visualizações no YouTube. Sozinho, o inconfundível dididididiê de Cheio de manias coleciona mais de 100 milhões de reproduções no Spotify.
“Ninguém nunca bateu o recorde de público da nossa temporada no Canecão, por exemplo”, relembra Luiz Carlos. O espaço, que fechou em 2010, era uma tradicional casa de espetáculos, localizada em Botafogo, Rio de Janeiro. “Nós éramos convidados a tocar nas comunidades e os shows lá eram de graça, então chegamos a tocar para um público de 60, 70 mil pessoas. A partir do momento que começamos a tocar nas casas de shows como o Canecão e o Metropolitan, nós batemos o recorde de público, porque toda a comunidade descia para nos assistir”, conta.
Em comemoração às quatro décadas de sucesso, a banda embarcará, no próximo dia 9, em um navio temático intitulado Cheia de Manias em Alto Mar. O cruzeiro promete reviver o melhor dos anos 1980 e 1990, com direito a convidados especiais como Belo, Leonardo, Menos é Mais, Fundo de Quintal e um encontro do supergrupo Gigantes do Samba, composto por integrantes do Raça Negra e Alexandre Pires.
O sucesso do grupo de Luiz Carlos não se resume apenas ao Brasil. A banda já fez turnês por toda a América Latina, cinco países da Europa, mais de 30 shows nos Estados Unidos e apresentações até mesmo no Japão. Fenômeno também na Coreia do Sul, a banda foi lembrada no K-Festival, evento coreano em celebração aos 60 anos da imigração sul-coreana no Brasil, realizado em Brasília no início do mês. Durante o festival, o embaixador da Coreia do Sul, Lim Ki-mo, chegou a entoar, em português, alguns versos do maior sucesso dos músicos paulistas.
Raça Negra comemora 40 anos de trajetória com navio temático
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