quarta-feira, 12 março, 2025
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Noi, gli immigrati

(o la farsa italiana)

Anselmo Brombal – Jornalista

Aproveitando a época de festa da uva, nada melhor do que lembrar a grande farsa da história dos imigrantes italianos no Brasil. Só teatro, muito fora da realidade, da história em si. O povo italiano é apresentado como festeiro, como se suas principais atividades tivessem sido música e cozinha. Nada disso.
Por partes: os italianos que vieram para o Brasil foram, na maioria, oriundos da região norte da Itália. Os do sul, notadamente Sicília e Calábria, foram para os Estados Unidos. E levaram para lá a Máfia, também conhecida como Cosa Nostra. Aqui eles chegaram entre 1880 e 1930.
No final do século 19, a Itália passava por dificuldades, e a fome era uma constante. No Brasil, a abolição da escravatura era dada como certa, e acabou acontecendo em 1888. O governo brasileiro da época divulgou na Itália que estava aceitando imigrantes, de olho na mão de obra para a lavoura, que substituiria a mão de obra escrava. Para a Itália seria um alívio se livrar de tantas bocas famintas.
E os italianos vieram. Em viagens de navio que duravam semanas, em péssimas condições de conforto. Aqui chegando, foram encaminhados para a lavoura. Famílias inteiras, alojadas em verdadeiros casebres. E nas fazendas, foram constantemente enganados pelos patrões na hora do pagamento. Em muitas dessas fazendas, eram praticamente obrigados a comprar em armazéns controlados pelos próprios patrões. Tudo descontado (a mais) no pagamento.
Com o tempo, e à custa de muito trabalho, esses italianos juntaram dinheiro e foram para as cidades, onde, enfim, puderam exercer suas habilidades longe da enxada. Eram excelentes marceneiros, carpinteiros, pedreiros, serralheiros. E foi esse trabalho que começou a mudar a paisagem urbana. A novela Terra Nostra, exibida pela Globo há alguns anos, ajudou a formar essa imagem linda e maravilhosa da vida dos imigrantes. Outra farsa.
Conheci Pedro Pacini, químico italiano que inventou nossa Turbaína, no tempo e que trabalhei na Ferráspari. Já idoso, era um dos primeiros a chegar e um dos últimos a sair. Sempre estava à procura de novidades, em busca da perfeição. Trabalhei ao lado de um fotógrafo, Elio Cocheo (cuja história já contei), que mesmo em idade avançada não faltava a um dia de trabalho, e não recusava nenhuma pauta. Trabalhei também com Massaru Furuta, aqui Paulo Furuta, outro fotógrafo incansável, apesar da idade.
Somente depois dessa mudança é que os italianos passaram a festejar alguma coisa, principalmente acontecimentos ligados à religião católica. Os mais velhos diziam que os portugueses, também imigrantes, tiveram mais sorte, tornaram-se principalmente comerciantes, porque chegaram primeiro.
Aqui a prosperidade veio com trabalho. Nos Estados Unidos, a Màfia tratou de explorar o contrabando, a fabricação e venda de bebidas alcoólicas durante a Lei Seca (1920 a 1933), jogos, prostituição e tráfico de drogas. Os três filmes da série O Poderoso Chefão é um retrato praticamente fiel da época nos Estados Unidos.
Hoje, a comunidade de descendentes de italianos – oriundi – é a maior do mundo aqui no Brasil. A influência na cultura e nos costumes é enorme – basta ver a quantidade de pizzarias em todas as cidades. E o respeito e valorização que a Itália tem pelos oriundi pode ser medido na facilidade de se conseguir cidadania italiana – basta ter a documentação.
Não só italianos passaram por dificuldades ao chegarem no Brasil. Libaneses, portugueses, japoneses, alemães, poloneses também sofreram. Havia a barreira da língua, dos hábitos e até algum preconceito por parte dos brasileiros. E tudo foi superado.
Passou da hora de acabar com esse teatro, com essa fantasia. Italianos e outros imigrantes foram explorados à exaustão, e venceram as dificuldades pela força de vontade, pela determinação e pelo trabalho. Falo como oriundi. Ouvi muitas histórias reais de família e de famílias de amigos. Não foi nada fácil.
Como oriundi, gesticulo, falo alto às vezes, não gosto de pizza – prefiro macarronada – gosto de carne de porco, de vinho e de boa música. E sou palmeirense. Avanti Palestra!

(21 de fevereiro é o Dia Nacional do Imigrante Italiano – pelo menos isso)

Anselmo Brombal
Anselmo Brombalhttps://jornaldacidade.digital
Anselmo Brombal é jornalista do Jornal da Cidade
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