Anselmo Brombal – Jornalista
Chegamos em dezembro. E já começou a época mais morfética do ano. Época dasfestas sem ter o que comemorar. Época da falsidade das comemorações, dos abraços de urso e beijos de Judas. Todos anos as cenas se repetem. Em muitos casos, ficam piores, mais desagradáveis.
Se você tem um vizinho chato, paciência. Com toda a certeza, a mulher dele é tão chata quanto ele. Ou até mais. Daquelas que coloca as mãos na cintura pra conversar. Parece uma xícara. E provavelmente os filhos também são mal educados. E aí, no domingo, quando você resolve descansar…
Seu vizinho resolve fazer churrasco. Com carne barata, que fogo cheira sebo. Com linguiça de terceira, também cheia de sebo. E seu vizinho chama os parentes e os amigos. Daqueles que falam alto, sem noção. Espia por cima do muro – você verão então o Clube do Bolinha. Os marmanjos num canto, discutindo futebol e política. As mulheres em outro, atualizando as fofocas da rua.
Não sei o que essa gente tem contra o silêncio. E não há churrasco sem que algum idiota resolva colocar suas músicas preferidas. Só porcaria. E num volume ensurdecedor. Fodam-se os vizinhos. Se tiver karaokê, pior ainda. Só gente desafinada, escrota, metida a cantar. E como o carvão da churrasqueira é o mais barato, voam fagulhas pra todos os lados. Se sua mulher estendeu roupa branca no varal, vai ter de lavar de novo. Foda-se também sua mulher.
Você percebe as intenções antes, quando vai ao supermercado. Normalmente esses “churrasqueiros vão em grupo. No carrinho: bandeja de linguiça barata, litro de 51, bandeja de asa de frango, alguns limões e um pet de Itaipava. É uma trotura por antecipação. Uma prévia do fim de semana.
Nos restaurantes já começaram as baixarias. Confraternização da “firma” dizem os chatos. Ocupam uma mesa enorme. Cada um quer falar mais alto que o outro. Se o chefe for, pior ainda. Disputa-se sua atenção. E tem troca de presentes – uma das maiores cafonices já criadas pelo comércio.
Se você estiver nesse restaurante, procura prestar atenção nos comentários – é uma forma de encarar esse programa de índio. Você vai ouvir mais de um (ou uma) se referir àquela moçoila de saia curta e pernas de fora: todo mundo aqui da “firma” já comeu e a cara de pau ainda traz o namorado chifrudo.
Vai ter mocinha chorando depois de umas caipirinhas por causa do amor não correspondido do colega de seção. E sabe o que ela faz? Vai chorar no banheiro. E as amigas vão juntas para consolar a infeliz. Mas neste fim de ano há dois lados, o bom e o ruim.
O bom é que a carne está cara. Tudo está mais caro. E isso limita os churrascos e as confraternizações. Poderia custar ainda mais para acabar de vez com essa escrotidão. O lado ruim é que a Shopee, Marcado Livre e outras estão com preços baixos para caixas de som e microfone. E pobre adora cantar seu karaokê.
Pensou que era só isso? Calma, ainda tem as vésperas de Natal e Ano Novo. Tudo bem parecido. Você leva cerveja Heineken; seu cunhado leva Itaipava – e toma sua Heineken. Não tem karaokê, certamente. Mas vai ter o CD da Simone. Então é Natal…
Entendeu agora porque rezo todos os dias para ganhar na loteria? Quero passar os próximos dezembros em Quixeramobim, longe desse mundo “civilizado”. Com a TV desligada. De papo pro ar. Isolado. Sozinho. Um verdadeiro ermitão. E que se foda o mundo.