sexta-feira, 22 novembro, 2024
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Separatistas aplaudem falas de Zema sobre frente Sul-Sudeste

A criação de uma frente política em defesa do “protagonismo” de estados do Sul e do Sudeste, recém-anunciada pelo governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), tem sido defendida por grupos que pregam uma separação definitiva entre Sul e Norte do Brasil.
Em entrevista do jornal O Estado de S. Paulo no domingo (6), o governador mineiro anunciou o novo Cossud (Consórcio Sul-Sudeste) e comparou o país a um produtor rural que dá “tratamento bom para as vaquinhas que produzem pouco e deixa de lado as que estão produzindo muito”. As primeiras seriam Estados do Norte e Nordeste, enquanto as últimas seriam Estados do Sul e Sudeste. As falas, que tiveram forte reação em Brasilia, também rendem debate intenso nas redes sociais.
Pelo Twitter, um mapa do Brasil com as palavras “muro já” separando Estados ao Sul e ao Norte junto à frase “força Zema, apoiamos você” foi curtido e compartilhado quase 10 mil vezes.
“Já passou da hora de pensarmos na possibilidade de independência dos Estados do Sul e Sudeste. Chega de pagar a conta de Estados que não querem nada a não ser sugar até a última gota de sangue de quem trabalha e produz”, reagiu o perfil de um grupo separatista paulista no Facebook, junto a um link para a entrevista do governador de Minas Gerais.
A Constituição brasileira não permite a independência de Estados da Federação.
Questionado sobre o apoio de movimentos separatistas às falas do Zema, o governo de Minas Gerais encaminhou link para um tuite em que o governador afirma que “a união do Sul e Sudeste jamais será pra diminuir outras regiões”.
Outra versão do mapa do Brasil, excluindo totalmente estados acima de Minas Gerais, circula em grupos no Telegram com hashtags separatistas defendendo a independência do Sul do país. Nas mesmas redes, separatistas compartilham junto à fala de Zema a defesa do que chamam de “Brasil do Sul” ou “Confederação Sul-Sudeste” – uma proposta de divisão política definitiva no país.
“A bandeira deles é uma das nossas há 31 anos”, diz Nãna Freitas, presidente do Movimento O Sul é o Meu País, que desde 1992 defende a separação definitiva de Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná do resto do Brasil. “Mas sabemos que um passo precisa ser dado de cada vez”, continua Freitas.
“Não estamos aqui pra buscar uma secessão à força. Isso nunca fez parte de nossa caminhada. Agimos de maneira democrática e consultiva a população, aderindo simpatizantes da ideia. Existimos e resistimos ano após ano por trabalharmos dentro do que a Constituição Federal nos permite.”
Segundo o primeiro artigo da Constituição Federal, a República Federativa do Brasil é “formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal”. O pacto federativo é cláusula pétrea da Constituição – ou seja, não pode ser alterado a não ser que uma nova Carta Magna seja promulgada.
‘Está sendo criado um fundo para o Nordeste, Centro-Oeste e Norte. Agora, e o Sul e o Sudeste não têm pobreza?’, questionou Zema. Ao Estadão, Zema disse que governadores do Sul e do Sudeste estão se organizando em busca de “protagonismo” político e econômico no Congresso Nacional.
Segundo o governador de Minas, a criação formal do Cossud (Consórcio Sul-Sudeste) tem como objetivo defender a região do que ele define como tratamento privilegiado às demais regiões do país.
“Está sendo criado um fundo para o Nordeste, Centro-Oeste e Norte. Agora, e o Sul e o Sudeste não têm pobreza? Aqui todo mundo vive bem, ninguém tem desemprego, não tem comunidade… Tem, sim”, disse o mineiro ao jornal.
“Nós também precisamos de ações sociais. Então Sul e Sudeste vão continuar com a arrecadação muito maior do que recebem de volta? Isso não pode ser intensificado, ano a ano, década a década. Se não você vai cair naquela história, do produtor rural que começa só a dar um tratamento bom para as vaquinhas que produzem pouco e deixa de lado as que estão produzindo muito. Daqui a pouco as que produzem muito vão começar a reclamar o mesmo tratamento. É preciso tratar a todos da mesma forma.”
Na entrevista ao jornal, Zema disse ainda que Sul e Sudeste representam “56% dos brasileiros” e “70% da economia do pais”, mas agem de maneira desarticulada no Congresso. “Estados muito menores em termos de economia e população se unem e conseguem votar e aprovar uma série de projetos em Brasília.”
“Nós (…), que sempre ficamos cada um por si, olhando só o seu quintal, perdemos”, afirmou.
As falas geraram uma onda de críticas de autoridades em todo o espectro político. À direita, o deputado federal e ex-governador de Minas Gerais Aécio Neves (PSDB) disse que “infelizmente, o governador Zema, talvez por não ter se expressado da forma adequada, acabou por criar mais problemas que as soluções que busca”.
“Sempre precisamos e muitas vezes contamos com alianças com outras regiões, em especial o Nordeste brasileiro. Minas nunca foi antagônica às regiões mais pobres do país, até porque fazemos parte delas, muito menos imaginou liderar esse antagonismo”, continuou Neves.
Ex-ministro do Turismo de Jair Bolsonaro, Gilson Machado (PL-PE) disse “repudiar veementemente qualquer fala que sequer ventile a separação de nosso País”. “O Nordeste não é peso para ninguém,o Nordeste é rico”, afirmou, endossado pelo ex-chefe da Secom (Secretaria de Comunicação Social) de Bolsonaro, Fabio Wajngarten. “Parabéns, Gilson. O Brasil é nordestino”, escreveu o bolsonarista.
Até o governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB-ES), que também faz parte do Cossud, se colocou. “Sobre a entrevista do Governador Zema (MG) para o jornal Estado de SP, é importante deixar claro que é sua opinião pessoal. O ES participa do Cossud para que ele seja um instrumento de colaboração para o desenvolvimento do Brasil e um canal de diálogo com as demais regiões”, disse.
À esquerda, o ministro da Justiça Flavio Dino classificou Zema como “traidor da Constituição é traidor da pátria”. “Absurdo que a extrema-direita esteja fomentando divisões regionais”, disse. Para a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva (Rede-AC), a importância de um Estado não pode ser definida pelo “peso populacional”.
“Sem a Amazônia, não tem como ter agricultura, não tem como ter indústria, não tem como o Brasil sequer ter vida no Sul, Sudeste e Centro-Oeste, porque a ciência diz que seria um deserto igual o deserto do Atacama ou do Saara”, disse Silva em suas redes sociais.
“Portanto, não é uma questão de quantidade em termos de peso populacional, é uma questão de trabalharmos com o princípio da justiça ambiental e do PIB dos serviços ecossistêmicos que são gerados por essa região”, continuou a ministra.
Em nota assinada pelo governador da Paraíba, João Azevedo (PSB), o Consórcio Nordeste afirmou que Zema cria “um movimento de tensionamento com o Norte e o Nordeste”. “Negando qualquer tipo de lampejo separatista, o Consórcio Nordeste imediatamente anuncia em seu slogan que é uma expressão de ‘O Brasil que cresce unido’. Enquanto Norte e Nordeste apostam no fortalecimento do projeto de um Brasil democrático, inclusivo e, portanto, de união e reconstrução, a referida entrevista parece aprofundar a lógica de um país subalterno, dividido e desigual.”
Até a publicação da reportagem, a única autoridade de peso a apoiar publicamente as falas de Zema foi o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB-RS). “Seremos todos mais fortes quanto mais formos um só Brasil. Não acredito que o governador Zema tenha dito nada diferente disso. Se disse, não me representa”, escreveu em suas redes sociais.
Leite disse ainda em vídeo: “A gente nunca achou até hoje que os estados do Norte e do Nordeste haviam se unido contra os demais estados do país. Pelo contrário, a união desses estados em torno da pauta que é de interesse comum deles serviu de inspiração para que a gente possa, finalmente, fazer o mesmo. Não tem nada a ver com frente de Estados contra Estados ou região contra região”.
Após as criticas, Zema voltou ao tema em suas redes sociais. “A união do Sul e Sudeste jamais será pra diminuir outras regiões. Não é ser contra ninguém, e sim a favor de somar esforços. Diálogo e gestão são fundamentais pro país ter mais oportunidades. A distorção dos fatos provoca divisão, mas a força do Brasil tá no trabalho em união.”

Anselmo Brombal
Anselmo Brombalhttps://jornaldacidade.digital
Anselmo Brombal é jornalista do Jornal da Cidade
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