Anselmo Brombal – Jornalista
Todos nós, de 50 anos ou mais, já reclamamos alguma vez dos tempos atuais. No meu tempo… Não, no nosso tempo. Hoje tudo está diferente, e não adianta reclamar. Somos a bananeira que já deu cacho, a página virada. Somos o passado, e o passado não vai voltar. Podemos ter lembranças, boas ou ruins, mas lembranças não fazem o tempo voltar.
Quando crianças, queríamos entender como um carro acendia suas lâmpadas (faróis) sem estar ligado à rede elétrica. Aprendemos que existia uma coisa chamada bateria. Nâo entendíamos também como um avião podia voar sendo pesado, feito de aço. Também aprendemos. Acostumamo-nos às calculadoras mecânicas, à máquina de escrever, ao curso de datilogafia. E então vieram os computadores. No começo, eram chamados de cérebro eletrônico. Enormes. Mas isso também é passado. Está enterrado ou exposto em museus e coleções.
Víamos bons filmes com gente que sabia interpretar. Charlton Heston, por exemplo, encarnou Moisés em Os Dez Mandamentos e Judah Ben Hur em Ben Hur. Convincente demais. Vimos John Wayne bancar o durão – era o cowboy de verdade. Massa bruta. Vimos Brigitte Bardot, Gina Lolobrigida, Claudia Cardinale esplendorosas. Mas elas envelheceram, como nós. Também são o passado.
Sentimos a chegada dos jeans, o indigo blue, a princípio contrabandeados. Quem nunca comprou uma calça Lee naquela época? Os jeans dominaram o mundo e estendeu essa denominação a todo tipo de roupa que foge do convencional, do paletó e gravata, da saia plissada, o vestido tubinho. Mas isso também é passado. Nunca mais iremos lavar nossas calças Lee esfregando-as com tijolos para parecerem usados. Hoje elas já chegam rasgadas. É moda.
Ouvíamos o que havia de mais moderno na música, o rock´n roll. Cantávamos Beatles e víamos seus filmes. Dos Beatles, restaram Paul McCartney e Ringo Starr, nada mais. Passávamos muito tempo em lojas de discos escolhendo nossos vinis. Acabaram-se as lojas. Vieram os CDs, e agora, só internet, o streaming. Quem imaginaria isso há 30 ou 40 anos?
O Agente 86 telefonava com seu sapato. Era o “celular” da época. James Bond, o 007, tinha um carro que dispunha de um equipamento – meio radar, meio GPS – que permitia localizar os agentes do Dr. No. Hoje celular é tão banal, tão comum, que não dá para imaginar o mundo sem ele. Mas esses filmes também são passado. Permitem recordações, algumas sessões cult, mas jamais voltarão.
Mas reclamamos sempre. No meu tempo… Tínhamos caderneta na padaria, no açougue e na vendinha. Tudo marcado a lápis. Hoje pagamos com pix ou cartão. Nada de dinheiro no bolso – e nem saúde pra dar e vender. Somos dependentes de planos de saúde, caríssimos por sinal. E estávamos acostumados ao médico que nos visitava em casa e até trazia o remédio.
Tínhamos fogões à lenha, que produziam comidas com sabor incomparável. Panelas de ferro e colher de pau para fazer polenta. Hoje nos cansamos das panelas com teflon, que não deixam grudar alimentos. Temos o microondas. E pior, temos a comida pronta, feita sabe-se lá como. No nosso tempo… bem, no nosso tempo, um pintinho leva seis ou sete meses para se tornar frango. Hoje bastam 30 dias. Tudo à base de hormônios.
Sonhávamos com uma família feliz, como nas fotografias que eram publicadas nas Seleções do Reader´s Digest. Mas descobrimos com o tempo que isso é para a maioria só um sonho. Não há mais famílias numerosas. Nem pacíficas. Nem coesas. É cada um por si. Mutas famílias colocam pais em asilos e casas de repouso para poderem passear com seus cachorrinhos. Valores totalmente invertidos.
Com os anos, muita gente acabou enburrecendo. E então criaram a inteligência artificial…
Passado é passado. Não adianta reclamar.
E quer saber? Vou dormir que ganho mais. O presente que se dane.