sexta-feira, 22 novembro, 2024
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Jornalista detalha em livro a cumplicidade de empresários com Hitler

Livro de jornalista holandês detalha como industriais alemães patriarcas de famílias até hoje à frente dos negócios colaboraram com o terceiro reich de Hitler e usufruíram de suas benesses

Quando era repórter da Bloomberg News em Nova York, David de Jong costumava ser escalado para escrever matérias sobre os países de língua germânica. Todo ano, viajava para a Alemanha, Áustria e Holanda e voltava com reportagens marcadas pela mistura entre finanças, negócios e fatos históricos. Foi quase inevitável se deparar com uma situação perturbadora: parte da pujança da Alemanha do século 21 foi construída em cima dos escombros de um genocídio e de um dos regimes mais cruéis da história contemporânea.
O resultado dessa constatação está em Bilionários nazistas, fruto de uma investigação da trajetória de cinco das maiores empresas alemãs durante a Segunda Guerra mundial e como elas contribuíram para enriquecer o terceiro reich de Hitler e alimentar a máquina nazista. Volkswagen, Dr. Oetker, BMW, Porsche e Allianz não são as únicas grandes corporações alemãs a terem contribuído com Hitler e usufruído das benesses resultantes dessa parceria, mas foram escolhidas por Jong por ainda serem controladas pelas mesmas grandes famílias que estavam à frente dos negócios nas décadas de 1930 e 1940.
“Essas companhias sempre celebraram os pais, avós e patriarcas pelo sucesso dos negócios, mas deixavam de fora os crimes de guerra e as afiliações nazistas. Falavam como fizeram um trabalho lindo, reconhecendo o passado, mas estavam, na verdade, escondendo o passado, lavando a história. E por isso decidi escrever o livro, porque queria jogar luz nessa história”, explica o autor.
Ele lembra que outras famílias também fizeram fortuna com o nazismo, mas não estão mais à frente das empresas e não são influentes, caso da Thyssen e da Cooper. De Jong queria focar nas famílias. Para entrar no livro, não bastava apenas que fossem relevantes hoje, mas que estivessem entre os maiores criminosos ou entre os maiores beneficiados do Terceiro Reich em termos de produção. “Eles roubaram as empresas do judeus e exploraram trabalho escravo em larga escala”, diz.
Bilionários nazistas é uma imersão detalhada na maneira como se desenvolviam as relações entre os nomes mais poderosos do regime nazista e os empresários. Do financiamento da campanha de Adolf HItler à produção de armas e dos uniformes das SS, da apropriação das fábricas e empresas pertencentes a judeus à criação de coleções de arte formadas por obras saqueadas a pedido de Hitler, são muitos os caminhos percorridos por nomes até hoje venerados como patriarcas, que dão nomes a prédios, complexos industriais, prêmios e fundações. Eles estiveram à frente de impérios que ajudaram na construção da riqueza germânica.
Foi Ferdinand Porsche quem convenceu Hitler a produzir o Fusca. O ditador queria imitar Henry Ford, que anunciava a produção em série de um carro popular acessível nos Estados Unidos. Porsche viabilizou o desejo. Filho de Ferdinand, Ferry, que desenhou o primeiro carro esporte da Porsche, foi mais adiante e se tornou voluntário das SS, o braço militar do partido nazista. Magnata do ferro e do carvão, Friederich Flick, que viria a ser um dos principais acionistas da Daimler-Benz, não viu problemas em utilizar o trabalho escravo dos campos em suas fábricas e Günthe na mão de obra forçada. Os Quandt são os patriarcas de um império hoje no comando da BMW e Herbert chegou a construir um subcampo de concentração na Polônia.
Para de Jong, o que mais choca é que a Alemanha sempre foi um país empenhado em revisar o passado nazista e em trabalhar para evitar que a história se repetisse, mas não conseguiu levar a transparência aos atores mais poderosos da cena econômica. “É perturbador, a realidade é perturbadora”, constata o autor. “Há uma lacuna na desnazificação da Alemanha Ocidental. Basicamente, houve uma continuação de dinheiro e poder da Alemanha Nazista para a Alemanha Ocidental e não foi só na Alemanha, foi um fenômeno global porque são companhias globais. São marcas muito conhecidas no mundo inteiro.”

Anselmo Brombal
Anselmo Brombalhttps://jornaldacidade.digital
Anselmo Brombal é jornalista do Jornal da Cidade
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